Durante o inverno, várias espécies de aves migram para
outros locais nos quais o clima está mais ameno... Foi pensando nisso que me
lembrei do texto Momento “Andorinha” escrito num sábado de 2013. Era dia
14 de setembro e faltavam sete dias para o início da primavera no hemisfério
sul, onde vivo. Lá e então, citei a simbologia das andorinhas:
–No Islã, é símbolo de renúncia. Entre os persas,
representa despedida, por causa de sua natureza migratória.
Lá e então, escrevi:
– E as andorinhas chegarão de longe... Trarão
poetas... Pois eles migram sempre!
Por meio dessas releituras deduzi que, sendo inverno,
minhas andorinhas deveriam ter partido. E por onde andariam meus poetas?
Deduzi que, para o meu inconsciente, meus criadores
pelas palavras não amariam a frieza da solidão... Ao contrário, os ‘meus
poetas’ amariam o fogo da criação capaz de animar qualquer sentimento inerte...
De elucidar qualquer ato obscuro... De movimentar qualquer marasmo insolente...
Sei que meus poetas vivem o parodoxo que segue:
chegam com as andorinhas nos locais privilegiados, mas não abandonam, nem se
abandonam. Nem todos os poetas sofrem de depressão como leigos em poesia podem
supor. O trabalho do poeta resulta "de um estado ou momento poético vivido [que é] algo semelhante ao que a Terapia da Gestalt descreve como [...] entrar em contato com o aqui e agora [...não diz] respeito à pessoa civil e sim a um eu poético." (MEROLA. 2014. P 48).
O processo de criação é alquimia. Seu resultado
almejado é transformar todo metal em ouro. A transformação na alquimia é
interior e uma alteração ocorre, concomitantemente àquela. Alteração significa
ação do outro (alter) dentro de nós. A ação social é matéria prima da
constituição do sujeito: é modificadora e gera crescimento. A frieza, o
fechamento, a ilusão, a imaginação inoperante, a inconsciência e a inconstância
se dissipam na alegria do acolhimento. É por esse movimento de tropismo que se
dá a busca da luz, da novidade, da clareza, da conscientização... O processo
alquímico de encontro transforma o banal em preciosidade, transforma a busca
interior em mudança social, transforma a busca em iluminação. Esse processo que
parece tão complexo faz parte de ações corriqueiras [por um lado, e] algo
fantástico como andar, confortavelmente, de mãos dadas com um dragão[por
outro]! (MEROLA, 2012. P. 16).
Com um exemplar de No Ano do Dragão em mãos e
aberto à página dezesseis, aqui e agora aceno em adeus às imaginárias
amigas andorinhas. E contemplo um verdadeiro céu de
manhã de inverno que tem também sua beleza. Entendo que outros
pássaros virarão palavras... Pois meus poetas são pessoas inquietas (talvez por
olhar o humano em suas grandes misérias e grandiosas belezas)... Mas
transformam inquietudes em expressão que supera a espreita e se transforma em
ato cidadão pela comunicação.
Poetas são seres paradoxais assim como a beleza do
recolhimento contemplativo de uma manhã de inverno e do acolhimento solidário, em qualquer estação.
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