A crônica ganha cada vez
mais espaço literário. O presente texto pretende ilustrar como o referido gênero pode ser profícuo ao se
valer da estratégia de resenhas. Em forma de colagem, vale-se de seis obras
de cinco autores diferentes para analisar
disfunções do bem-estar humano: a fofoca e schadenfreude (que significa
satisfação obtida com a desgraça alheia); o assédio moral.
Um
levantamento realizado pela Linkedin revelou que a fofoca é o que mais irrita
os profissionais brasileiros no ambiente de trabalho. A resposta foi apontada
por 83%, enquanto a média global era de 62%.
O
psiquiatra José Ângelo Gaiarsa em seu livro Tratado
Geral Sobre a Fofoca afirma que somente 20% das informações trocadas entre
as pessoas são realmente úteis e que a fofoca está diretamente ligada à
insatisfação que as pessoas sentem com relação às suas vidas. Ele argumenta
também que nós estamos sempre envolvidos em fofoca, seja como vítimas, seja
como agentes. Veja um trecho (extraído do capítulo 3 - "Uma Hipótese
Chamada Fofoca"): "Todos nós nos sentimos VÍTIMAS da fofoca - quando
ela chega a nós. Mas ninguém se sente AGENTE da fofoca. Estranho, não? É que
fofoca MESMO só "ELE" faz... - Eu? - NUNCA!”.
O
livro Como funciona a Fofoca escrito
por Tracy V. Wilson e traduzido por HowStuffWorks Brasil traz dados que são
frutos das pesquisas de vários cientistas sobre o tema. Alguns pesquisadores
concluíram que a fofoca começou como uma forma pela qual os primeiros humanos
conheciam seus vizinhos para determinar em quem podiam confiar. A fofoca seria,
portanto, uma ferramenta necessária para a sobrevivência.
Robin
Dunbar, autor de Grooming, Gossip and the Evolution of Language,
apresenta uma teoria segundo a qual a fofoca nas sociedades humanas tem o mesmo
papel que o coçar nas sociedades primatas, porém com mais eficiência. Dunbar
foi mais longe ainda ao afirmar que a linguagem evoluiu para que as pessoas
pudessem fofocar e, assim, estabelecer e defender seus grupos sociais de forma mais
eficaz.
Dentre
as semelhanças apontadas entre “jogar conversa fora” e o coçar ressalta-se a
constatação de que é distração ou desabafo; podendo vir a reforçar os laços
sociais. As pessoas que partilham da roda de conversa passam a fazer parte de
um grupo, reforçando as interações sociais. Os membros de um grupo influenciam
a opinião uns dos outros, trocam informações importantes, apontam e reforçam
regras sociais, aprendem com os erros dos outros. As conversas sem compromisso
e aparentemente fúteis podem ajudar as pessoas a aprenderem como se comportar e
como entender o funcionamento social de forma mais rápida e eficiente que a
observação direta.
Uma
conversa pode ser fútil sem ser maldosa. Porém, isso não significa que todas as
fofocas sejam boas. O grande marco divisor é distinguir se há ou não desejo de
prejudicar os outros e se isso implica em inexplicável prazer. Ou seja, a
pergunta que não deve calar é:
−
Houve o que a língua alemã consegue resumir numa só palavra, a saber: schadenfreude que significa satisfação obtida com a desgraça alheia?
Quando
alguém espalha fofocas negativas e
aumenta o próprio status social à custa dos outros, a sociedade depara-se com
uma situação de grande prejuízo ético. Em tempos de grande audiência do
programa televisivo Big Brother todos
deveriam se preocupar muito com isso!
Desta
feita, quando ocorre schadenfreude fica
difícil apoiar a fofoca como uma ferramenta social necessária.
Mas
não se pode tampouco depreciá-la como um mal social desnecessário, se
considerarmos as conversas de adolescentes que em seu grupo falam sobre outros
colegas de classe que não se encontram em seu grupo. Trata-se, no caso, de
mecanismo de autoafirmação usado para o próprio desenvolvimento.
O
Psicólogo Rogério Martins (autor do livro Reflexões do Mundo Corporativo)
afirma que o ambiente corporativo é
altamente favorável para as fofocas ("rádio peão") e que isso traz
prejuízos às finanças e ao ambiente. Rogério
Martins prescreve cinco dicas para lidar com a fofoca:
1.
ÉTICA - o primeiro passo para evitar a fofoca é pensar o quanto a informação
que está sendo passada é verdadeira e se vai acrescentar alguma coisa caso seja
passada adiante. Pense: o que vou ganhar com isso? Esta informação trará
melhoria no ambiente que estou? Irá favorecer os relacionamentos?
2.
REFLEXÃO - sempre que ouvir algo de alguém procure primeiro refletir antes de
agir. Há pessoas que repassam informações falsas para criar situações
comprometedoras. Quando alguém decide agir sem analisar a veracidade das
informações poderá se comprometer ou tirar conclusões erradas.
3.
SEJA UM EXEMPLO - quem não quer ser motivo de fofocas não deve fazer fofocas.
Evidente que isto não garante que falem mal de mim pelas costas, mas certamente
evita muitas situações deste gênero.
4.
AFASTE-SE - procure afastar-se das pessoas que você percebe que são
fofoqueiras. Além de não acrescentarem nada a você, ainda corre o risco de ser
visto como um fofoqueiro (a) também.
5.
DISTINÇÃO - saiba distinguir fofoca de informação. Fofoca é tudo aquilo que vem
com a intenção de atacar alguém, sem conteúdo ou simplesmente com segundas
intenções. Há informações que são trocadas na empresa e não estão classificadas
como fofoca. Para distinguir é importante voltar para a primeira dica, isto é,
usar critérios éticos para decidir se o que ouviu é verdade; se isso irá
acrescentar algo para si ou para a associação, ou ainda para o ambiente.
Há
ainda dois importantes livros de temas correlatos, ambos escritos por Marie -
France Hirigoyen: Assédio Moral – A
Violência Perversa no cotidiano; Mal-estar
no Trabalho – Redefinindo o Assédio Moral.
Hirigoyen
define o assédio moral como algo
revelado por palavras e comportamentos repetidos com frequência e que visam à
desqualificação e desmoralização profissional e a desestabilização emocional e
moral da pessoa assediada, tornando o ambiente desagradável, insuportável e
hostil. A vítima do assédio (funcionário de empresa ou mesmo voluntário ou
associado de instituições sem fins lucrativos) se sente aprisionado a situações
difíceis e que muitas vezes acarretam-lhe prejuízos sociais ou pessoais tais
como problemas de saúde.
Aos
presidentes institucionais, líderes comunitários, gerenciadores de empresas
recomendo a leitura atenta das seis obras citadas− GAIARSA: Tratado Geral Sobre
a Fofoca; DUNBAR: Como funciona a Fofoca; WILSON: Grooming, Gossip and the
Evolution of Language; MARTINS: Reflexões do Mundo Corporativo; HIRIGOYEN:
Assédio Moral e A Violência Perversa no cotidiano e Mal-estar no Trabalho.
Boa leitura!
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