sexta-feira, 5 de abril de 2013

A Figura do Narrador: Oficina de Criação Literária. Por Edna Domenica Merola

A Narrativa em primeira pessoa é algo simpático às crianças, pois a usam naturalmente, sendo isso inerente a sua organização cognitiva egocentrada e de acordo com o pensamento operacional concreto. No entanto, a narrativa em primeira pessoa, na análise do texto literário contemporâneo, passa a ser algo bem ao gosto do raciocínio abstrato. A Estética Pós Moderna sugere ao leitor incauto certa negativa de diferenciação entre autor e narrador.

Ao coordenar oficinas, acho oportuno ajudar o escritor iniciante a 'ousar' em suas investidas literárias com a conscientização dessa linha de diferenciação. Isso poderá auxiliá-lo a construir seu texto de forma a afirmar que a diferenciação é válida ou que, ao contrário, se trata de uma 'narrativa performática' ou autobiográfica. Poderá também dar as condições a construir uma narrativa que instale essa dúvida no leitor, fazendo disso material estético.  

O que é narrar? É escolher um foco para uma escrita constituída basicamente de verbos que expressam ação e encadeiam causas e consequências, revelando a interação de elementos para a realização de fatos.

Um Narrador Personagem conta a história de uma perspectiva de dentro da história, participa do enredo, é um dos personagens, usa os pronomes ‒ eu ou nós ‒ para narrar. Quando um escritor expõe um texto narrativo de sua autoria, usando o pronome eu, ocorre dos ouvintes perguntarem se a história é verídica. Se a temática é contemporânea, se o narrador for onisciente, tudo isso fará o leitor suspeitar se há certa veia autobiográfica. O viés recorrente é a leitura de mundo que os autores expressam na construção da ficção sob a própria percepção do momento social vivido no cotidiano (que chamamos de realidade, costumeiramente).

A narrativa pós moderna pressupõe que o lugar narrativo, (de onde e de quem parte a história narrada) é mais apelativo do que o conteúdo anedótico daquilo que é exposto, descrito e 'narrado'. A narrativa Pós Moderna se insere em tempos nos quais livros de autoajuda se tornam best sellers e seus autores se destacam em modalidades sócio profissionais diferentes da de escritor... Ou seja, autor e narrador se fundem de tal forma a confundir o aprendiz de literatura na distinção entre ambos.

O jogo didático é um recurso adequado para estudar algo um tanto complexo, quer seja, o da análise da voz do narrador como instrumento de interferência na narrativa Pós Moderna.

O uso do jogo didático aqui referido é a uma interpretação do psicodrama sob um enfoque histórico-cultural. Moreno identificou três fases no desenvolvimento de um papel: a primeira que é a tomada de um papel; a segunda que é a fase em que se joga o papel e a terceira que ocorre quando se cria sobre o papel. Quanto mais desenvolvido for o papel, maior será a espontaneidade que ele apresenta, ou seja, maior a capacidade de dar respostas novas a situações novas ou respostas adequadas a situações velhas. O fator espontaneidade é passível de desenvolvimento na interação com os colegas de aprendizagem, dadas as circunstâncias estabelecidas pelos contextos, instrumentos e etapas do jogo dramático que configuram a atividade como vivência de teor ético e estético.

Jogo para adultos. Utilização de cartas do Tarô.

Anteriormente à aula de 04/04/2013, em Oficina de Criação Literária do NETI, a professora Edna convidou duas alunas Contadoras de Histórias do Projeto do NETI a participarem do preparo da aula. Léa e Dulci contaram dois fatos verídicos transcorridos há algum tempo atrás, em cidades distantes de Florianópolis. Os temas seriam relativos a comportamento e costumes. Os fatos referidos, de preferência não deveriam ter sido vivenciados pela maioria dos participantes que os conheceriam sob o viés dos relatos de Léa e Dulci. O texto de Léa Palmira e Silva teve por título “Na Praia Grande”.O texto de Dulcireni Grein Ferreira teve por título “Carmem e Ernesto”. Após ler as histórias originais, cada participante escolheu uma para construir sua versão sob o ângulo de um “personagem narrador” inspirado em um dos arcanos maiores do Tarô de Marselha, anteriormente utilizado no jogo de criação de personagens, durante o aquecimento utilizado na aula de 04 de abril.

Aquecimento: Você anda pela sala de aula, experimenta os diferentes ritmos de caminhar. Faz de conta que anda até a rua principal de uma cidade fantástica. Nessa rua: encontra com alguém que lhe dá um cartão mágico (Carta do Tarô).  Incorpora a figura da carta e caminha como ela. Conversa em dupla, sendo esse personagem. Conversa em um quarteto. Apresenta o quarteto aos demais participantes.

Produção textual: vide http://NETIATIVO.blogspot.com.br

 Outra ilustração: Um Jogo rápido para Oficina de Redação 

O jogo a ser aplicado em oficinas ou aulas regulares de redação: é rápido e fácil, em sua aplicação.
Para iniciar o jogo, pede-se a algum participante que conte um fato verídico transcorrido há muito tempo atrás e em alguma cidade distante do local no qual ocorre a atividade. O fato deverá ser relevante à época na qual ocorreu, podendo ser de extrema banalidade nos dias de hoje. Temas relativos a comportamento e costumes são propícios, mas convém não rejeitar assuntos de outra natureza. O 'passado' referido, geralmente não foi vivenciado pelos jovens participantes que o conhecem sob o viés de relatos de familiares ou de novelas de TV.
Após ouvir o primeiro narrador, outros participantes são convidados a recontar a história. Cada um a sua vez recebe a senha de fazê-lo sob o ângulo de um personagem como um anjo, um fofoqueiro, um locutor de programa sensacionalista, um religioso, um político,etc... A princípio, a senha é conhecida apenas por um dos participantes.
Por força dos narradores serem personagens tipos, o conteúdo anedótico da história originalmente narrada é alterado significativamente. Por exemplo, em um grupo no qual o jogo foi aplicado, optou-se por uma história que, originalmente, terminava por suicídio. No entanto, ao ser reproduzida por alguém que recebera a senha para fazê-lo assumindo a vez de um anjo, a história terminou com a continuidade da vida harmônica de todos os personagens. Pessoa do grupo julgou que a história tinha sido contada de forma errada, ao que o narrador (anjo) respondeu que como anjo teve poder para proteger o personagem para que não se suicidasse, podendo com isso alterar toda a história. É essa a natureza performática do narrador a que, agora , se alude, aqui. 

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