domingo, 6 de abril de 2025

Déjà vu, jamais vu - Denise Wendhausen e Edna Domenica

           Déjà vu

Denise Wendhausen  

 

Zumbidos, zambados, zombavam de mim,

enquanto, entre quatro paredes,

combinava roupas de diversas cores....

iluminadas, apagadas, pastéis...

 

Disfarces acelerados pela cafeína 

tão preta quanto a sombra feita, assim,

na imagem na parede, nua de mim.

 

Entrava num circuito enfurecido de sarar 

e fechar os buracos...sucessivos, 

estanques e sucessivos

nos quais sibilavam  Sibilavam... sssssss ... sis

 

Combinando com minha blusa mostarda de 1993, 

quando comprei uma bota que ainda me servia,

entendi que tudo era velho e novo 

e que, com novos contornos, todo dia se abre,

mas sempre com déjá vus:

- Com cheiro de mostarda de 1993.

(Denise Wendhausen)

 

Jamais vu

Edna Domenica


Curtidos, cortados, calavam em mim,

enquanto, entre quatro paredes,

cultivava cores acamadas, desbotadas

 

faces apresentadas pela rotina 

tão incerta quanto a sombra feita, assim,

na imagem consumada, lua de mim.

 

Entrara num circuito esquecido do estimar 

e fechar os horizontes...sucessivos, 

Alegres e expansivos

nos quais ecoavam  cantos... Encantos com...

 

Combinando com minha maternidade dada de 1990, 

quando percebi que tudo era belo e doloroso 

e que, com novos entornos, todo dia se abria

mas sempre com jamais vus: 

 – Com cheiro de fralda no pacote.

(Edna Domenica)

Perdas entre linhas. Edna Domenica Merola e Cassiano Silveira

         Perdas entre linhas

 

Às vezes tropeço na pedra,

Pra desviar da flor,

E de asfalto em asfalto,

de Drumond em Drumond, devagarinho,

o caminho, volto atrás

Pra resgatar evocado ninho.

Perdi os óculos, o WD 70 e o martelo

Varri a poesia e revi lar comezinho

Onde ecoam óculos, WD 70 e martelo:

Museu dos meus, puro elo.

Outras vezes o tropeço na perda

É pra desviar da dor.

(Edna Domenica Merola)

 

Outrora nos meus tempos de criança

Ora era herói ou justiceiro

Ora  bicho brabo ou engenheiro

Bandido, cavaleiro em andança

 

O tempo deturpou a esperança

O que é daquele todo inteiro?

Foi-se o sol. Armou um tempo feio

Onde havia tempo de criança

 

Lá se foi meu projeto de futuro

 Finda a ilusão de perfeição

Lá havia ponte, aqui há muro.

 

Perdi  tempo, meta e vocação

Perdi sonho e medo de escuro

Perdi  santos e  fé na oração.

(Cassiano Silveira)

 

Ora (direis) contar as perdas, certo

perdeste o Censo! E eu vos direi, no entanto,

Que, pra contá-las, muita vez desperto

E fecho as canelas, pálido de espanto…

 

E computo por toda a noite, enquanto

A via-láctea, como um pálio aberto,

Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,

Inda as lembro (sob um véu esperto).

 

Direis agora: “Tresloucado amigo!

Que procuras com elas? Que sentido

Tem o que lembras, quando estão contigo?”

 

E eu vos direi: “Perdei para entendê-las!”

Pois só quem perde pode ver sentido

Ter paz pra ouvir: entender sequelas.

(Edna Domenica Merola) 

Poema ancestral - Edna Domenica Merola, Léa Palmira e Silva, Marlene Xavier Nobre, Taís Palhares

         Poema ancestral

Edna Domenica Merola, Léa Palmira e Silva, Marlene Xavier Nobre, Taís Palhares

 

Meu lado europeu

É um jubileu

De abraços e traços

Um traseiro afro

Um nariz mouro

Pele alva (de sabe Deus!)

A face com contornos romanos

 

Em Madri me segregam

(Sou a cara da moça na lata do azeite)

Em Perúgia me chamam de francesa

Em Pomerode sou forasteira

Em Floripa meu sotaque sofre bullying

 

Em São Paulo trabalho com meu corpo

trabalho com o corpo de minha mãe,

trabalho com o corpo de minha nona...

E, quando isso não é dor,

O retrato do meu avô me sorri no corredor

(Edna Domenica)

 

Indígena,

Português,

Espanhol,

Caboclo,

Mestiça...

À terra: plantar, caçar.

 

Natureza, liberdade.

Passado, presente futuro.

A vida passada em gerações. 

Tudo junto e misturado.

 

Olhar no espelho,

Enxergar a mãe, o pai, os avôs

 

E as novas linhagens, 

Quais características trarão? 

[Tais Palhares]

 

Sou um lado indígena e outro africana

Isso me faz latina?

A parte de pai é sulina  

De mãe, nordestina 

 

Manezinha de Floripa 

  Outrora de praias, recôncavo e tantas belezas naturais

Hoje exploradas pelos capitalistas brutais –

 

Da ancestralidade, as labutas

Desde a infância quantas lutas!

 

Acho a velhice demais 

Graças aos meus ancestrais.

 [Léa Palmira e Silva]. 

 

Vento sul, mar azul, areia a rodopiar: 

Mané e manezinha a bailar,

Depois de nove meses

O meu choro "ouvisses".

 

Nasci no mês do "mata cavalo",

 num frio de doer pescoço!

 

Sou festeira e manezinha nata,

E por ser filha de artistas, sou grata

Cresci comendo pirão,

caldo de peixe e camarão! 

 

Quem trouxe meus ancestrais?

Seria o vento sul soprando nos manguezais?

 

De onde vim? 

Não sei de mim!

 

Será sou sarará?

Ou será sou sarará crioula? Sei lá!

 

O que importa é ser faceira,

mané charmosa e maneira. 

(Marlene Xavier Nobre)

 

Em homenagem às moradoras

  estrangeiras, brasileiras

E também às turistas

Que curtem Floripa demais

Dedico um soneto sem “ais”:

 

Canta, Floripa canta… Cantarás!

Escutarás: “Conserva tua história…”

Cidade e praias brilham na memória

Encanta a gente, encanta…Encantarás!

 

Com belo Boi de Mamão brincarás

Com a Bernunça de boca lusória…

Guga! Avaí! Figueirense! Que glória!

Renda de bilro à Lagoa terás.

 

Praias da Ilha: ouvirás Mirandinha

Zininho com Amor à Ilha: teu hino

Pântano do Sul, dás tua tainha

 

Lagoa da Conceição: sol a pino

Lagoa do Peri branca prainha:

Floripa ama e canta como imagino!

[Edna Domenica Merola]